Que futuro trará a habitação para os jovens portugueses?

O acesso à habitação tem sido um dos temas mais falados nos últimos tempos, e é fácil entender o motivo. Não só pelo forte aumento dos valores que se verificou nos últimos anos, como também pela inflação, que retirou aos portugueses poder de compra, e ainda pelo aumento das taxas de juro, que por si só retirou poder de escolha, aquando no momento da compra de habitação. Este é um tema transversal a todas as gerações.

E como ficam os jovens portugueses, a tão proclamada “geração mais qualificada de sempre”, numa nação que cada vez mais precisa deles, mas não consegue mantê-los?

Para contexto, a idade média de saída de casa (dos pais) em Portugal, ronda os 33,6 anos, de  acordo com o Eurostat, sendo o pior resultado na União Europeia (média de 26,5 anos). Segundo um estudo (relativo a 2021) da Fundação Francisco Manuel dos Santos, 58% dos jovens portugueses refere a instabilidade económica como o principal motivo. Mas não podemos deixar de parte os baixos salários e os preços exorbitantes de renda praticados. Segundo o estudo mencionado acima, o salário (no ano de 2021) dos jovens (entre 18 a 34 anos) após as taxas, são de:

  • Até 413€ – 9%
  • 414 – 600€ – 14%
  • 601 – 767€ – 30%
  • 768 – 950€ – 19%
  • 951 – 1158€ – 14%
  • 1159 – 1375€ – 5%
  • 1376 – 1642€ – 4%
  • Acima de 1642€ – 3%

Todos os fatores mencionados, bem como a dificuldade no acesso à habitação, podem ter consequências no futuro, nomeadamente na natalidade e na saúde mental.

É de conhecimento geral que Portugal é um país envelhecido, e esta tendência parece vir para ficar. A taxa de fertilidade está à volta de 1,3 filhos por mulher (em idade fértil), sendo este um valor significativamente inferior à taxa de renovação de 2,1 filhos, que é necessária para a manutenção da população. Ora, com o salário médio na ordem dos 1200 euros brutos mensais, bem como os preços exagerados das habitações (inclusive de rendas), nomeadamente em Lisboa e no Porto onde reside mais de 50% da população, sobretudo jovem, e num país onde uma grande parte destes jovens são licenciados, estes vêem-se forçados (ou fazem planos cedo) a emigrar, de uma nação que precisa deles.

Não deixa de ser peculiar a quantidade de vezes que as gerações mais antigas dizem que os jovens deveriam ficar em Portugal, e consequentemente melhorar o país, desempenhando o seu papel na restruturação da sociedade. Este pode ser um pensamento correto, uma vez que os jovens são mais qualificados e possivelmente possuem capacidades de melhorar, aos poucos, a situação portuguesa, mas (existe sempre um mas) como é que existe coragem de pedir aos jovens que se sacrifiquem para ajudar a nação, quando não existe a preocupação do Governo, em criar medidas que os mantenham no território português? É nítido que os jovens veem cada vez menos razões para ficar.

Quando falamos em tempos antigos, digamos, há umas décadas, era normal abdicar de coisas de que gostávamos. O que sucedia era que os jovens, num comportamento “natural”, saiam de casa cedo, casavam-se e constituíam família. Mas isto mudou. As gerações mais novas têm outras aspirações, e projetos de vida completamente diferentes. A valorização do investimento profissional e pessoal ganhou ímpeto, uma vez que são mais instruídos e viajam mais, colocando de lado o percurso “casar cedo e ter filhos”.

No que diz respeito à crise de habitação, esta é visível de Norte a Sul, do Porto ao Algarve, onde existe cada vez menos habitação, a valores que sejam compatíveis com os rendimentos, o que se traduz num número cada vez maior de jovens ansiosos e frustrados, no qual a sua “luz ao fim do túnel” passa pela emigração.

Segundo dados do INE – Instituto Nacional de Estatística, o preço das habitações em Portugal alcançou um novo máximo histórico, em 2022, ao registar um aumento de 13,2% entre o primeiro trimestre e o mesmo período do ano anterior. Juntando os rendimentos médios quase paralisados, a ascensão da inflação e o aumento dos bens essenciais, todos estes fatores contribuem para consolidar a ideia de que vivemos uma crise de habitação. E como ficam os jovens nesta situação? A maioria não consegue adquirir uma habitação própria, e os que conseguem, mergulham de cabeça para uma possível situação económica insustentável, o que coloca em causa a sua estabilidade financeira.

Mas a literacia financeira representa um papel fundamental, e é algo que falta em Portugal. Os jovens pouco ou nada sabem sobre taxas de juro ou impostos. Isto vai afetar no momento de decisão ao pedir um empréstimo, uma vez que os bancos podem confirmar que um jovem pode pagar hoje, mas no futuro isso não é certo, e não há ninguém que ensine a melhor forma de realizar esta ação, que pode levar a uma subida exponencial da taxa de esforço.

Face a um cenário não promissor, os jovens demandam soluções ao Governo, que vão desde o investimento em habitação público, definição de tetos máximos para o valor das rendas a apoios (mais) ajustados à atual situação. No entanto, existe um programa do Estado, que foi criado em 2007, com o intuito de apoiar jovens a sair de casa dos pais – o Porta 65 Jovem.

Para beneficiar deste programa, estão aptos jovens com mais de 18 anos e menos de 35 anos, sendo que, caso seja um casal, um dos elementos pode ter, no máximo, 36 anos (desde que o outro não tenha mais de 34 anos). É necessário apresentar ainda as condições de titularidade de um contrato de arrendamento para habitação permanente, não receber quaisquer subsídios ou apoio à habitação, não ser parente do senhorio e não ser proprietário de outro edifício ou habitação. Caso os jovens cumpram estes requisitos, podem proceder ao envio da candidatura para o Porta 65, que possui três fases distintas todos os anos, em abril, setembro e dezembro. Na eventualidade de o jovem ser elegível, poderá ser atribuída ao mesmo uma renda, que vai variar dependendo da tipologia da habitação, bem como do concelho.

Como nem tudo é um mar de rosas, o programa, apesar de ser considerado uma “boa intenção” de apoiar os jovens, pode não ser a solução mais eficaz no mercado de habitação. De acordo com os critérios do programa, quase todos os jovens são elegíveis, mas o problema fulcral está no lado do senhorio. Isto porque o programa inclui um teto máximo de renda, o que faz com que alguns senhorios não queiram participar do programa, uma vez que preferem cobrar um valor mais elevado, ou até mesmo por desconfiança para com o Estado. Isto resulta num número reduzido de senhorios interessados, o que por sua vez se reflete num número menor de jovens que são abrangidos pelo apoio.