“Só o ativo é que está imóvel. O avaliador tem de mover-se.” – João Garcia Barreto, Head of National Business da Aura Ree Portugal

João Garcia Barreto, Head of National Business da Aura Ree Portugal

A importância da avaliação imobiliária, as entidades que a regulamentam e as dificuldades do setor estão cada vez mais na ordem do dia. A atividade da avaliação imobiliária é um bem imprescindível para o setor imobiliário.

João Garcia Barreto, Head of National Business da Aura Ree Portugal e também membro do RICS (Royal Institution of Chartered Surveyors) explicou ao Brainsre News Portugal alguns destes temas, bem como as possíveis reformas na atividade.

Enquanto membro do RICS e dada a importância da Avaliação Imobiliária, como a considera nos dias de hoje e qual o seu futuro?

A avaliação é extremamente necessária, para variadíssimos efeitos, por exemplo, aquisição, alienação, efeitos contabilísticos (aferição do justo valor para suporte aos auditores), efeitos de supervisão por parte da CMVM (aferição dos valores de mercado dos imóveis pertencentes a Fundos de Investimento Imobiliário), efeitos de partilha, efeitos de insolvência de empresas ou de particulares. No fundo, a avaliação está associada a decisões que tanto são para o bem (um investimento) como para solução de um problema. Um ativo imobiliário está associado a montantes avultados. É um bem de investimento, não é um bem de consumo. Por isso, o investimento é uma decisão que deve ser tomada com pés e cabeça, como costumamos dizer. Quando alguém está doente ou até quando quer fazer prevenção da sua saúde, faz agendamentos de consultas, certamente a um médico ou um especialista na área da medicina. Então, é exatamente isso que um avaliador é. É uma espécie de médico que pode orientar ou alertar o cliente para o bem ou os males do imobiliário. Ser MRICS é a forma perfeita de demonstrar ao cliente ou o utilizador do serviço que quem prestou o mesmo é altamente qualificado e obedece a elevados padrões éticos. Acrescento ainda que não sou só um membro, estou também registado como avaliador do RICS e estou sujeito a monitorização. Tanto eu como o José Covas, Managing Partner na Aura Ree Portugal. Solicitar um serviço a um consultor que cuja atividade é regulada, dá confiança a quem necessita dos seus préstimos.

Num artigo recente falou sobre a aplicação de novas reformas na avaliação imobiliária, em que medida deveria ser feita essa reforma?

Com a supervisão da atividade! A atividade de um perito avaliador de imóveis é sujeita a supervisão pela CMVM, sobretudo, para quem faz avaliações para o sistema financeiro. Atualmente, um perito avaliador paga uma taxa para supervisão. O Estado (e bem) obriga que a atividade seja supervisionada, mas pede a quem é supervisionado para suportar a mesma supervisão. Todos os peritos individuais e coletivos têm de pagar uma taxa compreendida entre os 300€ e os 600€, existe um vasto número de peritos, são realizadas inúmeras avaliações e a percentagem de avaliações supervisionadas é pequena. Claro, a supervisão tem de ser realizada com clareza. A responsabilidade não é só de quem executa a avaliação, mas também de quem supervisiona. Além disso, a CMVM tem de perceber na inscrição se a pessoa está mesmo apta para o exercício da atividade. Não basta ter licenciatura ou curso em conformidade com a lei. A pessoa tem de demonstrar experiência, só assim se comprova a sua capacidade. Acho também que não basta passar o ónus da supervisão para o gestor do fundo ou da entidade financeira. Tem de ser algo feito por todos. É um bem comum.

Outra reforma passa pela definição do preço por uma determinada avaliação, isto é, estabelecer limites mínimos de montantes. A CMVM não é e não pode ser responsável por isso. Não é competência do supervisor. Tem de ser algo concertado por todos os avaliadores para que a qualidade seja percebida pelo utilizador da avaliação. É como comprar um apartamento altamente eficiente em termos energéticos ou comprar um apartamento pouco eficiente. Consegue-se perfeitamente perceber onde reside a diferença. Um dá qualidade de vida, o outro pouca qualidade de vida. A RICS é extremamente importante para reforçar isso. “Fornecer um serviço de qualidade” é um dos princípios básicos da Royal Institution of Chartered Surveyors. RICS é um selo de confiança. Sobretudo agora, em que é preciso ter cuidado com os “low-costs”. O efeito Putin está a apertar o cerco e recai sobre todas as atividades. Por exemplo, o crescimento galopante dos preços dos combustíveis! Um avaliador tem de se deslocar ao local onde se encontra o imóvel. Só o ativo é que está imóvel. O avaliador tem de mover-se. Um MRICS tem regras específicas para esse tema.

Nos vários segmentos do imobiliário, as cidades de Lisboa e Porto tornaram-se altamente atrativas para investir, acredita que a alteração aos vistos gold poderá trazer uma nova dinâmica em outras regiões do país?

Os vistos gold foram importantes para nós no ano passado. Fizemos trabalhos para advogados que intermedeiam negócios de investidores estrangeiros. Em Lisboa e no Porto, os vistos gold trouxeram dinâmica às cidades que tiveram de adaptar-se à nova realidade. Em relação ao Porto, exemplifico sempre com a Rua das Flores. É, hoje, a rua com mais dinamismo na cidade e foi outrora a artéria mais “profunda”. Lisboa tem outra cor e parece estar mais larga e aberta. Mais iluminada. Depende da forma de cada um de olhar para as cidades, mas a minha cidade que é Lisboa já não é certamente a mesma que era há 10 anos. Está claramente mais cosmopolita. Tendo em conta o dinamismo observado em Lisboa e no Porto, diria que as outras regiões ganharão também com os vistos gold. Pelo menos, combataria a desertificação.

Enquanto Head of National Business da Aura Ree Portugal, que saldo faz dos últimos dois anos em que a pandemia dificultou muitas áreas de negócio, inclusivamente o setor imobiliário?

O negócio dos clientes locais sofreu uma ligeira descida na faturação, resultante dos primeiros meses da pandemia em que tudo estava praticamente no limbo, sem saber bem o que se fazer. Aproveitámos para ser mais proactivos e falar com novos clientes. Todavia, o ano seguinte (ou melhor o transato) foi bastante melhor em termos de faturação. Estamos naturalmente a trabalhar para aumentar, tentando ultrapassar o mal desejado efeito Putin. Resiliência continua a ser a palavra de ordem.

No seu contato com alguns dos maiores players do mercado, quais são os segmentos que considera atualmente mais ativos?

Sei que o sector logístico e o sector ligado ao retalho alimentar têm sido bastante procurados, já que estão associados a atividades que são extremamente necessárias hoje e sempre como o last-mile (entrega de encomendas, etc) e a alimentação. Foram até os sectores que foram mais resilientes na pandemia. Penso que o sector residencial vai ter uma queda. As restrições à concessão de crédito estão mais apertadas, as taxas de juro já vão estar ainda neste ano “acima do solo”, aproveitando a linguagem de avaliador.