“Se antes o setor de Industrial & Logística era o patinho feio do imobiliário hoje é um dos cisnes entre as diferentes classes de ativos” – Nuno Torcato, Diretor de Advisory & Transaction na área de Industrial e Logística, CBRE

Nuno Torcato, Diretor de Advisory & Transaction na área de Industrial e Logística, CBRE

O mercado imobiliário está a passar por uma fase muito dinâmica e a área da logística tem registado grandes operações no país. O desenvolvimento na procura por ativos de Industrial e Logística modificou-se em Portugal e um pouco por toda a Europa. Se por um lado, essa transformação é fruto da pandemia, para Nuno Torcato, Diretor de Advisory & Transaction na área de Industrial e Logística, CBRE, a invasão da Ucrânia originou um reequilíbrio a nível geoestratégico.

Entrevistado pelo Brainsre News Portugal, o recente Diretor de Advisory & Transaction na área de Industrial e Logística na CBRE, que assumiu o cargo no passado mês de setembro, fala-nos um pouco sobre as mudanças neste segmento e quais as perspetivas para um futuro a médio e longo prazo.

Recentemente assumiu o cargo de Diretor de Advisory & Transaction na área de Industrial e Logística na CBRE. Numa altura em que este segmento demonstra um grande crescimento, quais os seus principais contributos e estratégias?

Estes últimos anos foram de facto de forte crescimento tendo-se registado níveis máximos quer de ocupação quer de investimento. A CBRE Portugal foi durante este tempo consolidando a sua posição de liderança, não só pelas diversas operações de  arrendamento em que estivemos envolvidos e onde trabalhámos para os principais investidores e ocupantes a operar em Portugal, mas também com o envolvimento ativo da nossa área de capital markets nas principais transações ocorridas nos últimos anos. Não poderia obviamente deixar de falar da nossa posição de liderança neste sector sem deixar de referir os mais de 1,3 milhões de metros quadrados que gerimos na área de property management.

Sustentada por esta posição de liderança, e à semelhança do que já acontece noutras geografias, tomou-se a decisão de dar um passo único em Portugal e passar a olhar para este sector de uma forma vertical e integrada onde as diferentes áreas de serviço estão completamente interligadas funcionando como uma one-stop-shop para os nossos clientes. Esta nova estratégia é especialmente importante numa altura como a atual em que quase não existem de ativos disponíveis no mercado o que nos obriga a pensar em alternativas muito mais inovadoras como são o desenvolvimento de projetos de raiz, sejam eles especulativos ou específicos para algum ocupante.

Esta visão integrada ajuda-nos a juntar proprietários, promotores, ocupantes, parceiros financeiros etc. e com isto conseguirmos encontrar soluções para os nossos clientes que não passam apenas pelas poucas opções existentes no mercado. Esta dinâmica só funciona se estivermos em constante contacto com diferentes stakeholders do sector para em cada momento estarmos conscientes das suas estratégias e necessidades e de como, em conjunto, poderemos apoia-los no desenvolvimento das suas operações.

Acredito que a minha experiência profissional anterior muito ligada às áreas de development, banca de investimento, consultoria, fundos de investimento e financiamentos alternativos permite-me, não só ter uma visão mais abrangente das varias fases de maturidade dos projetos, desde o desenvolvimento à fase de rendimento, e das diferentes necessidades dos seus intervenientes, como também entender a estratégia de empresas a operar em diferentes setores de atividade e a forma como esta pode impactar as necessidades das mesmas a nível dos seus ativos industriais ou logísticos.

A pandemia acelerou a dinâmica na procura por ativos de logística. O que realmente mudou, na sua opinião?

A pandemia, numa primeira instância e, mais recentemente, a invasão da Ucrânia levaram a um reequilíbrio a nível geoestratégico que resultaram em grandes impactos no setor. Contrariando as tendências dos últimos 20 ou 30 anos, os mais recentes eventos puseram em causa todo o movimento de globalização uma vez que se entendeu que as cadeias de produção e distribuição não poderiam estar dependentes de uma decisão política (como são o encerramento das cidades na China devido ao Covid ou a invasão da Ucrânia e o seu impacto no fornecimento de energia ou bens de consumo) que poderia pôr em causa a capacidade das empresas operarem bem como a sua própria continuidade.  Este processo de “desglobalização” resultou por exemplo numa deslocalização das unidades de produção para a Europa ou na decisão das empresas em aumentarem os seus níveis de stock, duas situações com um impacto direto na forte dinâmica registada no setor de Industrial & Logística nestes últimos dois anos.

Adicionalmente, existem outros aspetos mais estruturais como são o crescimento do e-commerce e da logística inversa, o cada vez maior número de players a operar no setor de 3PL, a crescente importância da automação e da procura de espaços cada vez mais eficientes que levaram a um forte desenvolvimento de ativos industriais e logísticos nos últimos anos, o que lamentavelmente não aconteceu em Portugal, e consequentemente a um maior interesse de investidores por este setor. Se antes o setor de Industrial & Logística era o patinho feio do imobiliário hoje é um dos cisnes entre as diferentes classes de ativos e um dos principais targets dos investidores a nível mundial.

Em Portugal, temos de acrescentar o facto de nos últimos 20 anos quase não terem existido novos projetos a serem desenvolvidos o que resulta em que hoje o stock de ativos no nosso país é muito antigo, em certos casos completamente ultrapassado, o que exponenciou a concorrência pelos poucos ativos disponíveis no mercado que tivessem as condições mínimas de operação. Ao contrario da generalidade dos países europeus, nomeadamente aqui ao nosso lado em Espanha onde todos os dias vemos anúncios de novas plataformas a serem desenvolvidas, em Portugal o número de novos projetos que foram desenvolvidos foi muito reduzido e quase todos já com um ocupante final, resultando hoje numa enorme carência de oferta quando comparada com a forte dinâmica de procura que continua a existir no nosso país, quer seja de ocupantes quer seja de investidores que procuram ativos em rendimento.

Nos dias de hoje e sendo um segmento em expansão, quais as zonas de maior procura por parte dos investidores e promotores imobiliários?

Atualmente diria que a procura dos principais players do setor, sejam eles ocupantes ou investidores/promotores, continuam concentrados nos principais eixos industriais e logísticos no nosso país como são as zonas do Carregado, Azambuja, Oeiras, Sintra ou Loures na região de Lisboa ou nas zonas da Maia e Vila Nova de Gaia mais a norte. No entanto, a falta de terrenos/ativos disponíveis nestas localizações  bem como a pressão de subida de rendas nos últimos tempos levam a que diversos investidores e promotores imobiliários comecem a olhar para localizações que seriam menos óbvias no passado mas que hoje lhe permitem desenvolver projetos bastante eficientes, (seja por descontos de renda face as zonas consideradas prime, seja pelas características do próprio ativo ou pela disponibilidade de mão-de-obra nas proximidades por exemplo) que lhes permitem mitigar o facto de estarem um pouco mais longe das grandes cidades. Alguns players estão a olhar para localizações como Aveiras, Cartaxo, Benavente, Leiria, Santarém, Santo Tirso, Valongo etc, que comprovam o sucesso.

Especificamente mais a norte acreditamos muito no potencial das regiões de Porto e Braga muito pelos seus mais de 2,5 milhões de habitantes, pela capacidade industrial instalada e excelentes ligações rodoviárias a Espanha, ao Porto Marítimo e ao Aeroporto.

Vemos também um grande potencial em toda a região a Sul de Lisboa não só pela maior facilidade de encontrar terrenos e pelo custo de construção mais eficiente comparativamente a outras localizações, mas também pela cada vez maior dinâmica desta região em resultado do desenvolvimento planeado em zonas como Setúbal, Comporta, Tróia, Melides etc. Outro fator fundamental para o referido potencial é obviamente a maior proximidade ao Porto de Sines que nos próximos anos terá obrigatoriamente uma importância acrescida devido à atual conjuntura mundial e aos enormes investimentos que estão previstos para esta infraestrutura tanto ao nível do aumento da capacidade do porto e das suas operações, como das suas ligações ferroviárias e rodoviárias.

O ano de 2022 está a ser considerado um dos melhores anos de sempre na área de Industrial e Logística, qual o balanço e previsões da consultora para este ano?

O ano de 2022 destacou-se claramente no investimento no setor Industrial e Logístico atingindo um recorde histórico. Foram investidos mais de 600 milhões de euros neste sector até setembro compreendendo a transação de 60 ativos. Para tal contribuiu, em particular, a venda de três portefólios, mas também algumas operações avulso incluindo  de forward purchase e sale and leaseback.

No entanto, após o Verão, o ambiente macroeconómico e de investimento mudou substancialmente com a subida abrupta das taxas de juro. De facto, o atual contexto de elevada incerteza e consequente subida de preços está a prolongar algumas negociações e até a suspender outras. Antecipamos assim um abrandamento da atividade de investimento nos próximos meses mas ainda prevemos o fecho de alguns negócios até ao final do ano.

Até setembro, foram canalizados 1.800 milhões de euros para o imobiliário comercial de rendimento. Provavelmente não se vão atingir os 3.000 milhões de euros mas o valor será aproximado.

Em termos gerais que análise faz do mercado imobiliário nos últimos anos?

O mercado de investimento em imobiliário comercial evoluiu de forma expressiva ao longo da última década. Antes da pandemia da Covid-19 o mercado estava num novo patamar na ordem dos 3.000 milhões de euros/ ano, o que contrasta com volumes médios anuais na ordem dos 1.200 milhões de euros antes da Grande Crise Financeira.

Após a Grande Crise Financeira os ativos imobiliários passaram a estar no leque de um número muito mais alargado de investidores, quer por uma estratégia de diversificação de carteiras quer porque, de um modo geral, os ativos imobiliários revelam-se mais resilientes face a outras alternativas de investimento como ações ou obrigações.

Paralelamente verificou-se uma maior diversificação no leque de ativos alvo de investimento. O investimento no passado incidia predominantemente sobre ativos de escritórios, retalho e alguma hotelaria e hoje em dia verificam-se diversas transações em logística, como já demonstrado, assim como em residências de estudantes, residências para seniores e hospitais.

Fonte CBRE Research

Durante a pandemia verificou-se uma quebra na atividade de investimento que já está a ser recuperada em 2022.

O que perspetiva para um futuro a médio e longo prazo no mercado imobiliário e em particular neste segmento?

No imobiliário comercial de rendimento, a dinâmica do mercado vai depender muito da velocidade a que  vendedores assimilarem a correção de preços decorrente da subida das taxas de juro e do risco maior devido a uma eventual recessão.

Deste modo prevemos um período inicial de forte desaceleramento da atividade de investimento, associado a um desencontro de expetativas de preço entre compradores e vendedores, seguido de um retomar progressivo da atividade quando esse ajustamento ocorrer. Uma subida das taxas de juro e um maior clima de incerteza reflete-se inevitavelmente num aumento das taxas de rentabilidade. Desde o final do verão, verificámos subidas entre 25 e 50 pontos base (pb) na maioria das classes de ativos. Até ao final do ano é possível que se verifiquem acréscimos adicionais de 25 pb, e estima-se que poderão ocorrer mais na primeira metade de 2023.

No setor industrial e logístico em particular, deveremos observar no próximo ano uma redução do volume de investimento, dada a elevada rotação verificada em 2022. No entanto deverá haver um investimento substancial a nível de promoção de novos edifícios. Existe atualmente uma enorme escassez de produto para arrendamento e há diversos investidores a querer entrar neste setor e uma forte liquidez pronta para investir neste sector em Portugal.

 

 

 

 

 

 

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