“Prever o pior e esperar o melhor” – conferência NPL Days Portugal

A DD Talks chegou ontem a Lisboa e a capital recebeu a conferência NPL Days Portugal.

O evento reuniu investidores seniores, bancos, fundos, servicers e especialistas imobiliários conhecidos no setor, que atuam no mercado português de Non-Performing Loans. José Covas, Managing Partner da Aura REE Portugal, foi o moderador do painel de comentadores e apresentador da conferência NPL Days Portugal, que teve lugar no hotel Corinthia, em Lisboa.

O sistema bancário português detinha em 2020 o terceiro maior stock de empréstimos e adiantamentos em moratória, de 41,5 mil milhões de euros, segundo dados da Autoridade Bancária Europeia. Os bancos portugueses, com mais de 20% do total de empréstimos sob moratória, estão entre os mais dependentes das medidas de apoio à pandemia na Europa.

José Araújo, Millennium bcp; Nuno Martins, CGD; Volkert Reig Schmidt, GNB Real Estate; João Ferreira Marques, ActiveCap; Manuel de Macedo Santos, Alantra; Hugo Velez da HipoGes e Gonçalo Veiga Macedo, Linklaters fizeram parte da lista de convidados para os painéis apresentados na conferência.

Alguns dos temas mais falados passaram pelo impacto do novo coronavírus Covid-19, as decisões originadas pela pandemia, o fim das moratórias, o inevitável aumento de NPL’s e os lentos processos de licenciamento, dando destaque à simplificação de transações entre empresários, nomeadamente as burocracias relacionadas com a incoerência da documentação legal dos imóveis.

Gonçalo Veiga Macedo, Linklaters, numa visão geral do mercado de NPL em Portugal, introduziu a situação atual do estado do setor. Segundo o responsável, antes da pandemia existiu um aumento de transações, devido à pressão regulatória e às taxas de juro dos modelos da banca em Portugal, na altura o mercado encontrava-se estável e robusto com expressivo track record.

Atualmente e ainda em contexto de pandemia, Gonçalo Veiga Macedo salienta que “Portugal é um dos países da Europa com maior percentagem de créditos concedidos e sujeitos a moratória.” Acrescenta ainda que parte desta percentagem resulta de PME’s, sendo que a outra metade são relativas a particulares, crédito à habitação, entre outros. Portugal continua com um nível de NPL superior à média europeia, o país tem um rácio elevado, que continua concentrado nas empresas, sendo que a média europeia é 2.9%.

Entre 2020 e 2021, Gonçalo Veiga Macedo, refere o aumento do stock de NPL’s e o maior impacto nas PME’s, que se encontram com moratórias, possuem créditos e representam 60% do emprego do tecido empresarial português. Os sectores mais afetados são o alojamento, a restauração, o transporte e segmento de retalho. Existe uma clara tendência para que haja deterioração da qualidade do crédito e dos ativos, o que origina um aumento no risco de incumprimento.

No painel sobre resolução e alienação de NPL’s, foi novamente abordado o tema da pandemia, de forma a perceber como o Covid-19 apanhou a banca de surpresa.

Para Nuno Martins, da Caixa Geral de Depósitos, os bancos reagiram muito rápido, apresentando várias medidas e analisando os indicadores de custo e de risco. Nuno Martins, revelou que para esta retoma pós pandemia há que “prever o pior e esperar o melhor”. As contas dos bancos foram afetadas na tentativa de manter as contas de tesouraria das empresas, garantindo a liquidez das mesmas, enquanto que a nível particular foram criadas as moratórias para manter os interesses dos clientes particulares. Quando comparadas com o resto da Europa, as moratórias em Portugal são as maiores e mais longas.

Para Gonçalo de Macedo, a maioria do tecido empresarial Português é muito fragmentado e composto por pequenas e médias empresas tendo pouca competitividade a nível Europeu. No que respeita aos devedores, os grandes devedores não podem continuar a receber tratamento especial, há que agir de início. O turismo foi gravemente afetado e consequentemente poderemos assistir a um aumento de ativos NPL relacionados com esta atividade

Nuno Martins analisando uma perspetiva de retoma pós pandemia afirma que “Esta crise é exógena, não houve um conjunto de fatores que ao longo do tempo pudessem provocar uma crise, como se viu em anos de crise anteriores. Se o que aconteceu foi um choque exógeno, planear uma recuperação lenta não pode ser positivo.” Acrescenta ainda que “Retirando o fator choque exógeno, fazendo uma recuperação lenta, o exógeno passa a endógeno.” Mais uma vez se falou na reinvenção que será essencial, dado que muitos negócios deixarão de existir no pós-COVID.

Manuel Macedo dos Santos, Alantra, salienta que Portugal sendo um mercado vendedor, devia ter os investidores mais próximos do banco. Quanto ao futuro, salienta que seria benéfico a existência de parcerias para recuperação de créditos, há que ter bons aliados no mercado e em Portugal existem vários bancos que estão serenos e preparados para o que aí vem do impacto na rentabilidade (novo flow de NPL), com a chegada de novos players no mercado, poderão existir problemas de solvabilidade.

No painel de gestão da dívida e serviços de NPL’s sem garantia, Rui Maximino, Millennium bcp, afirmou que no ponto de vista da banca particular o processo de recuperação de crédito é relativamente equilibrado dado que não existem os mesmos obstáculos que existem nas empresas. Rui Maximino refere “existem entropias nos tribunais, há vários tipos de visões, umas mais estranhas que outras, mas que não reflete o panorama geral.” Acrescentando que “As entropias são passíveis de resolução, cabe-nos a nós fazer uma organização e ultrapassar os obstáculos.”

Pedro Valle Domingues, Hipoges Iberia, realça que quando em comparação com alguns países da Europa (Espanha, Itália, Grécia, entre outros) o nosso sistema judicial é um bom sistema. E existe agora um novo interesse, de um tipo de investidores que antes não o tinham neste tipo de investimento. Para Pedro Valle Domingues “As carteiras têm uma concorrência desmedida e os valores de compra evoluem pelo produto que é, mas também pela concorrência.”

Quanto às atualizações do setor imobiliário em crise, destaca-se o sector dos escritórios, que está ainda a tentar encontrar espaço, num mundo pós-pandémico, existindo alguma incerteza nas áreas a alocar para espaço, por parte das empresas após este novo contexto do teletrabalho.

Para Francisco Virgolino, Prime Yeld, “Prevê-se que o investimento em Real Estate cresça face ao ano anterior, sem esquecer a problemática dos 15 mil milhões de euros em moratórias a particulares que consequentemente vai fazer crescer o stock de NPL’s. O Banco de Portugal estima que 18% transformar-se-ão em NPLs.”

O tema dos vistos gold foi também abordado neste painel, tendo em conta o novo regime que vai entrar em vigor em breve, concluindo-se que será uma limitação para o investimento, o que não será um bom método para a retoma no pós-pandemia.

André David Nunes, Whitestar, refere que quanto a novos players existe uma migração de investidores pela falta de oportunidades para o sector imobiliário. “Assumiu-se que Portugal possui um mercado com boa liquidez, o que atraí investidores, mas com este contexto pandémico não é linear entre sectores” salienta.

Igor Borrego, CBRE, questionou o painel quanto a medidas legislativas que podem ser implementadas no imobiliário para que se possam travar as consequências do covid. João Pinheiro da Silva, CMS Rui Pena & Arnaut, afirma que “Há sempre qualquer coisa que se pode mudar. Os processos de licenciamento é uma das maiores dificuldades que tenho como advogado para explicar a um cliente estrangeiro os tempos que este processo leva”. João Pinheiro da Silva, acredita que para o sistema melhorar, deverão ser definidos prazos, as câmaras devem apostar na digitalização e desburocratização dos processos e devem também existir mecanismos “via verde” para que grandes investidores não fiquem tanto tempo presos a algumas burocracias.

Quanto às oportunidades de compra e quais as oportunidades de investimento, Francisco Bello, Bain Capital, refere que “As oportunidades são boas quando são atrativas” Menciona que atualmente é mais atrativo Real Estate do que NPL, por razões de investimento.

Hugo Velez, Hipoges Iberia, referindo-se ao contexto e perspetivas de retoma pós-pandémica, “Creio que este ano ainda não vamos ter o mesmo número de NPL’s e REO’s, será mais expectável que isso aconteça em 2022.” Para Hugo Velez, no fim das moratórias era benéfica a intervenção de fundos estrangeiros em processos de litígio, embora não haja essa tradição.

No final da sessão, o apresentador José Covas, Managing Partner da Aura REE Portugal, de forma a aligeirar o ambiente mundial que vivemos, referiu que “Em momentos como estes, temos que pensar positivo e aproveitar a vida. Muitos pensam que só temos uma vida e não tiram partido dela. No final do dia temos duas vidas. A segunda começa quando temos a consciência que só temos uma vida e começamos a aproveitá-la na integra. Façam por ser felizes e aproveitem a vida!”

A Aura Ree Portugal colabora enquanto media partner do NPL Days Portugal. A Aura REE é uma empresa líder em consultoria e avaliação de carteiras de ativos imobiliários, atualmente com escritórios em Espanha, Portugal, Itália e Grécia e com expansão prevista para a América Latina.