“Portugal beneficiaria com um maior dinamismo do segmento Build to Rent residencial” – Miguel Pereira Pinto, Head of Asset Management at Albatross Capital

Miguel Pereira Pinto, Head of Asset Management at Albatross Capital

Em entrevista ao Brainsre News Portugal, Miguel Pereira Pinto, Head of Asset Management at Albatross Capital, explica a importância do arrendamento residencial em Portugal, se o país terá ou não condições necessárias para dinamizar o mercado de Build to Rent e faz o balanço acerca da aquisição do portefólio ZIP.

A Albatross Capital é uma empresa de investimento imobiliário com foco nos mercados português e espanhol. Presente em Portugal desde 2017, opera predominantemente em joint venture com a Quantico, promotor de referência em Portugal. A Albatross está evolvida em diversos projetos, com destaque para a plataforma de Development (o projeto Antas Atrium) e a plataforma de Rental Residential (destaque para o portefólio ZIP).

No cenário que vivemos com altas taxas de juro e inflação, quais são as incertezas dos players do setor imobiliário?

O imobiliário, em linha com outros setores da economia global, vive um momento de incerteza de evolução futura, nomeadamente face à elevada inflação e ao crescimento das taxas de juro.

Considero existirem três principais incertezas de evolução que se destacam no setor: evolução dos custos de construção, do custo de financiamento e de yields, todas com impacto direto no valor dos ativos.

O aumento dos custos de construção foi o primeiro fator a gerar instabilidade, ainda durante a crise pandémica e alavancado nos constrangimentos logísticos sentidos. Os aumentos dessa fase, agravados pela subsequente e atual alta inflação, continuam a contribuir para o aumento do mais relevante “custo de produção” dos imóveis. Caso este fator não seja endereçado ou compensado, o mercado terá de assumir um aumento de preços dos imóveis, pelo menos proporcional.

Do lado do financiamento, parecem-me existir duas vertentes: o aumento do custo de financiamento ao desenvolvimento e à aquisição. No caso do desenvolvimento, mais uma vez, caso este custo não seja endereçado ou compensado, o mercado conduzirá a um aumento de preços dos imóveis. Por outro lado, o aumento do custo de financiamento na ótica do comprador condiciona a sua capacidade de pagamento, pressionando em baixa o preço.

Relativamente a yields, é já percetível no mercado uma inversão da tendência passada de compressão, verificando-se agora a expansão de yields. Mantendo-se esta tendência de evolução futura, o aumento de yields irá pressionar a redução dos preços de aquisição dos imóveis, caso não exista uma compensação noutros fatores.

O facto de existirem tendências contrárias quanto ao impacto que estes fatores podem ter no preço dos imóveis, reforçam a incerteza quanto ao futuro.

Os investimentos imobiliários continuaram a existir, mesmo após todos os constrangimentos em 2020, altura em surgiu a pandemia. O que mudou no processo de decisão?

Sim, os investimentos continuam, apesar da crise pandémica, mas também apesar de termos uma guerra em curso na Europa, apesar de se observar uma taxa de inflação historicamente alta e apesar de termos um acelerado crescimento das taxas de juro.

Parece-me importante referir que, atualmente, o processo de decisão para investimentos relevantes é predominantemente coletivo, suportado em reuniões (Investment Committees e outros) e, assim, em entendimentos de diferentes pessoas.

Relativamente à atual continuidade de concretização de investimentos, acredito que se deve por existirem no sector players com diferentes expectativas quanto à evolução das incertezas existentes no sector. Assim, entendo igualmente que, nas pessoas com responsabilidade num específico processo de decisão de investimento, existam igualmente diferentes expectativas de evolução destas incertezas, o que obriga a um maior debate e à necessidade de uma maior justificação do investimento face aos seus fundamentals.

Destaco igualmente que nos últimos anos tivemos situações atípicas com impacto na economia global, nomeadamente uma crise pandémica e uma guerra em pleno continente europeu, obrigando os decisores a analisar também novos riscos associados aos investimentos, que antes não chegavam a ser ponderados.

Estas incertezas e riscos têm tido igualmente impacto na duração do processo de decisão, verificando-se atrasos no calendário inicial da transação e na expectativa de ambas as partes.

Portugal tem condições necessárias para dinamizar o mercado de Build to Rent? De que forma?

Sem qualquer dúvida, considero que Portugal beneficiaria com um maior dinamismo do segmento Build to Rent residencial, no entanto, acho que atualmente existem relevantes condicionantes ao mesmo. Dividiria as mesmas em duas principais vertentes: Rendibilidade e Risco.

Ao nível da Rendibilidade, no meu entendimento, parece-me existir um desequilíbrio entre o investimento necessário para o desenvolvimento e a potencial receita das rendas. Comparando Portugal com outras geografias com dinamismo neste segmento, percebemos que a redução dos nossos custos de desenvolvimento é inferior à diferença de rendas versus essas geografias, o que simplesmente torna Portugal menos atrativo quanto à rendibilidade (rácio rendas/ custo de desenvolvimento).

Relativamente ao Risco, destacaria a incerteza quanto à estabilidade do arrendamento residencial, justificada predominantemente pela falta de segurança contratual. No meu entender o desenvolvimento deste mercado deverá assentar em projetos de escala elevada, tradicionalmente realizados por investidores institucionais internacionais, no entanto, estes são também os investidores mais sensíveis aos riscos legais e contratuais existentes.

Para que este mercado se desenvolva em Portugal entendo ser necessário resolver o desequilíbrio existente entre estas duas vertentes, a Rendibilidade e o Risco.

O mercado de arrendamento está a captar as atenções de investidores internacionais?

O mercado de arrendamento residencial é muito relevante no setor imobiliário em vários mercados internacionais, cativando o interesse de diferentes e relevantes investidores institucionais.

Portugal tem estado menos no radar destes investidores predominantemente devido à menor maturidade deste segmento (entraves legislativos históricos ao arrendamento residencial) e devido ao fator dimensão (inexistência de grandes projetos integrados de arrendamento residencial).

Ainda assim, nos últimos anos foram realizados alguns investimentos de referência neste segmento, nomeadamente o nosso portefólio ZIP que, pela dimensão e organização, nos parece único em Portugal.

Após dois anos da compra do portefólio ZIP, que balanço faz em relação a esta aquisição e qual o pipeline de projetos da Albatross para os próximos anos?

Fazemos um balanço positivo da operação ZIP. Internamente acreditamos na importância do arrendamento residencial para Portugal e foi isso que motivou a compra do portefólio em 2021. Nestes primeiros anos de gestão do portefólio conseguimos confirmar que uma parte relevante dos fundamentos que justificaram a decisão de avançar com este investimento estavam corretos, nomeadamente quanto à real procura por arrendamento residencial. Ainda assim, estamos ainda numa fase inicial do nosso plano (cerca de 50% do portefólio por arrendar) para retirar conclusões definitivas. Esperamos que o futuro confirme o atual balanço.

Relativamente à Albatross, de referir que estamos presentes em Portugal desde 2017, operando predominantemente em joint venture com a Quantico, Promotor de referência em Portugal. Desde essa data, temos estado envolvidos em diversos projetos, dos quais destacamos a nossa plataforma de Development (destaque para o projeto Antas Atrium) e a plataforma de Rental Residential (destaque para o portefólio ZIP). Presentemente, temos estado ativos no mercado, nomeadamente na aquisição de pequenos portfólios de Rental Residential, e temos em pipeline outros projetos que incluem diferentes segmentos, nomeadamente residencial, turístico e de escritórios, que esperamos concretizar a curto prazo.

Responsável pela coordenação da gestão do portefólio Zip e de investimento em portefólios semelhantes, quais os principais desafios que trazem o atual cenário?

Ao nível da gestão, os principais desafios estão ligados com características especificas do portefólio ZIP, nomeadamente desafios logísticos pelo elevado número de imóveis, e desafios associados ao atual contexto. Relativamente a estes últimos, destaco o aumento de custos de construção, a dificuldade em encontrar equipas de construção competitivas e também a crescente taxa de esforço dos compradores e dos arrendatários face ao crescimento das taxas de juro e da inflação.

Do ponto de vista de investimento, o mercado residencial tem apresentado uma elevada dinâmica, com números recorde de transações. Assim, o principal desafio que sentimos é a falta de produto no mercado pela elevada procura existente.

Com a falta de oferta que existe no mercado nacional, como prevê o futuro a longo prazo no segmento residencial?00

O momento atual do semento residencial caracteriza-se por uma elevada procura versus uma reduzida oferta, existindo incerteza do tempo necessário para a correção do lado da oferta. Na minha opinião, esta é a principal razão para o recente crescimento acelerado de preços e para a resiliência do setor, tendo em conta as atuais incertezas e desafios. O futuro do segmento parece-me ligado às respostas que vamos ter a este desequilíbrio.

Com positivas implicações futuras, sinto como relevante a crescente valorização do Governo a este segmento, destacando a recente criação de um Ministério exclusivamente dedicado à habitação. Para o setor parece-me um passo relevante, cuja expectativa é que traga soluções para os desafios à criação de nova oferta que já são debatidos há vários anos: agilização do processo de licenciamento, revisão da estrutura fiscal do setor, atualização da regulamentação/ legislação associada à habitação (e.g. REGEU, NRAU, …), entre outros.

Do lado privado, entendo que Portugal tem conquistado uma maior exposição a investimento internacional em imobiliário nos últimos anos, posição esta que espero que se venha a consolidar ainda mais, alavancada também no endereçar dos desafios anteriormente referidos. Este consolidar de investimento internacional e institucional deverá contribuir para o crescimento da oferta residencial tradicional, mas também de novos modelos residenciais alternativos, existentes de forma ainda residual no nosso mercado, que muito podem acrescentar e atualizar a oferta, como são modelos de Co-Living, Senior Living, Student Housing, Serviced Apartments, Branded Residences, entre outros.