“Onde estamos a sentir mais o reflexo da pandemia é na habitação” – Arq. Maria João Andrade

Maria João Andrade premiada com o "40under40" dos European Architecture and Design Awards 2020

Maria João Andrade premiada com o “40under40” dos European Architecture and Design Awards 2020, que distingue os melhores jovens arquitetos e designers emergentes na Europa, as figuras em ascensão a nível mundial no domínio da arquitetura e do design e os seus projetos extraordinários e originais, explica um pouco mais sobre os seus projetos e a preocupação com a sustentabilidade.

Os projetos levados pela arquiteta portuguesa ao concurso europeu e que valeram o prémio são a Casa no Vale do Douro, em Marco de Canaveses, e a Clínica Renal de Mirandela. Em ambos a preocupação de Maria João Andrade foi a sustentabilidade e a interferência mínima com a paisagem envolvente.

A preocupação com a sustentabilidade cria uma nova abordagem nos seus projetos. Em que medida consegue estabelecer esta ligação com o meio envolvente?

Na prática, a minha preocupação com a sustentabilidade vai logo desde o primeiro passo, realmente fazer um reconhecimento do terreno, perceber a sua exposição solar, a sua orientação e aí também conseguimos que o edifício tenha uma maior integração não só com a envolvente, mas também com ganhos solares. Existe realmente logo essa premissa de base, depois toda a dinâmica em que estudamos o edifício, pois todos os métodos construtivos são pensados em optimizar um edifício que tenha poucos requisitos de necessidades de energias de forma e que as energias renováveis que vamos utilizar consigam ser suficientes ou fazer um cumprimento quase na maioria das necessidades do edifício, obviamente que isto a 100% é muito difícil, mas se conseguimos 80% ou 70% já é um bom caminho para reduzirmos a pegada na área da habitação. Acho que é uma preocupação que embora eu já tenha há muito tempo, está cada vez mais presente no público em geral nas duas vertentes, na vertente ambiental e na redução dos custos na casa.

As pessoas hoje em dia deparam-se com um problema. a energia elétrica é das mais caras da Europa para aquecimento da casa e se não tivemos uma casa eficiente estamos muito desconfortáveis dentro do espaço e a gastar imenso dinheiro porque o calor dissipa-se. As pessoas quando estão a construir ou a reabilitar já se preocupam em ter conforto e em reduzir ao máximo os custos porque a longo prazo são muito pesados. Numa primeira fase, na fase de construção implica um investimento um bocadinho maior, mas costumo dizer que o investimento é pequeno para o ganho que vamos ter a longo prazo e preocupo-me a fazer essas contas para os clientes também perceberam que ganhos vão ter. Não só porque estamos a contribuir para a sustentabilidade do planeta, mas por outro lado também estamos a conseguir reduzir custos aos clientes por terem níveis de conforto sem pagarem uma exorbitância nas faturas, para manter uma casa confortável, sendo agora a casa o nosso espaço de primazia que é também o nosso espaço trabalho e o nosso espaço de lazer.

Tendo em conta que os seus projetos são díspares em termo funcionais, tanto para habitação ou edifícios, que pontos considera que existem em comum nos projetos que realiza?

O mais importante para mim é pensar que estou a fazer a obra para um cliente, para as pessoas, e existe um casamento, como costumo dizer, entre a minha abordagem e aquilo que são as vivências das pessoas. Eu quero que o cliente usufrua sempre de um espaço que tem as suas vivências. Na área dos serviços, como por exemplo na área de saúde, os clientes já têm um método, uma forma de trabalho e eu tento incorporar isso nos projetos. Na habitação, também a vivência que querem dar à casa, há clientes por exemplo que gostam de receber muitos amigos na cozinha e existem clientes que precisam de zonas de lazer ou de trabalho, a minha preocupação é ajustar os projetos às necessidades do cliente. Sempre que me pedem alguma coisa, tento encaixar e não gosto de impor as minhas ideias, não tenho efetivamente uma métrica de projeto e prefiro ajustar aos gostos ou necessidades de cada pessoa para que também tenha a identidade de pessoa e não só a minha.

Recentemente premiada num concurso entre 40 designers e arquitetos, como sente o reconhecimento do seu trabalho?

Foi muito bom, porque realmente no meu trabalho eu estava muito focada e já tinha recebido muitas vezes o convite para participar neste concurso e agora com o confinamento também houve coisas positivas, passamos a ler os convites que nos fazem, com atenção. O meu trabalho também exige muito de mim, até mesmo a nível de investigação e conciliar o trabalho com a vida familiar, acaba por ser uma entrega total e por isso nunca dei muita importância a este convite e este ano tive tempo de ler e pensei em mandar os projetos e não tinha noção do impacto do meu trabalho, de uma outra visão e é realmente positivo, porque de outra forma as pessoas não conhecem o nosso trabalho. Acontece muito com os arquitetos mais jovens, que o público não conhece o seu trabalho e é importante dar a conhecer e divulgar os nossos projetos para serem reconhecidos.

Em que medida a pandemia pode trazer alterações aos projetos que apresenta, nomeadamente numa altura em que se prevê um modelo de trabalho híbrido?

Onde estamos a sentir mais o reflexo da pandemia é na habitação. Sem dúvida é aquela em que estamos a ser confrontados de uma forma mais emergente, as pessoas estão preocupadas em estruturar o espaço da casa, outros pensam nos projetos e em contemplar áreas que antes não davam tanta importância, principalmente as famílias, a nível de som por exemplo quando estão num quarto, permitir que não ouçam o que se está a passar no outro quarto. Até agora o isolamento acústico era uma preocupação com envolvente da parte exterior e dentro do edifício, para a mesma família não havia essa preocupação, mas neste momento o ruído de fundo incomoda, enquanto alguém está a trabalhar o outro está por exemplo a ouvir música e é fundamental ter esses espaços, de forma a que as pessoas consigam ter estas dinâmicas sem serem afetados pelo quotidiano da casa.

Na área dos escritórios também nos surge a preocupação com os layouts, porque como reduziu a área de ocupação, o número de colaboradores no espaço, muitas vezes também encontramos soluções que permitam essa articulação. No fundo, passa pela colocação de postos para garantir os níveis de segurança, por isso estamos a sentir gradualmente essa grande mudança com que estamos a ser todos confrontados.

 

Todos os projetos vencedores serão apresentados na exposição “40 Young European Architects with New Visions” que terá lugar em novembro de 2021 em Atenas, Grécia, no EUROPEAN CENTER (74 Mitropoleos Str.), com duração da exposição e datas ainda por anunciar.